Neste ano, uma série de elementos favoráveis poderia estimular a expansão das lavouras de trigo no Brasil, mas, em vez disso, a área de plantio vai encolher. A produção deverá crescer em 2025, ainda que pouco, o que manterá o país ainda longe da meta de se tornar autossuficiente no cultivo do cereal.
Segundo o boletim mais recente da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), a área de cultivo deverá diminuir 11,7%, para 2,69 milhões de hectares. Ainda assim, a produção crescerá 4,6%, para 8,25 milhões de toneladas, graças à melhoria da produtividade média, que crescerá 18,6%, para 3.058 quilos por hectare, calcula a estatal.
O plantio de trigo já começou em diversas regiões do Brasil. No Paraná, um dos líderes da produção nacional, a semeadura já ocorreu em cerca de 400 mil hectares, o que corresponde a mais da metade da área prevista. Segundo Carlos Hugo Godinho, coordenador da Divisão de Conjuntura do Departamento de Economia Rural (Deral), o desenvolvimento das lavouras é promissor.
“As lavouras estão em ótimas condições, com chuvas regulares e bem distribuídas, o que permite o avanço do plantio conforme o zoneamento libera”, afirma. O trabalho está mais adiantado nas regiões norte e oeste do Estado.
A despeito dos elementos favoráveis à cultura, a área de cultivo no Paraná deverá diminuir 22% neste ciclo, para 887 mil hectares. “No momento, o preço do trigo está muito parecido, até melhor, do que o do ano passado. Em abril, ele chegou a estar 29% acima [do mesmo período de 2024]. Assim, se imaginaria um aumento na área. Mas isso não se confirmou”, disse ele.
As incertezas da economia ajudam a explicar a queda no plantio do cereal neste ano. Juros elevados encarecem o crédito e o seguro rural se mostra pouco atrativo para o produtor mitigar riscos. Outra parte da explicação está na competição com culturas que têm melhor expectativa de rentabilidade.
“O trigo é uma cultura de alto risco, que vira quase uma aposta para a safra de inverno. Com um seguro menos atrativo, o produtor que arriscava um pouco mais deixa de arriscar tanto”, afirma.
A soja, que costuma bancar o cultivo de trigo, também limitou o avanço do cereal de inverno. “Como o momento da soja não está bom, o apetite por risco diminui”, disse Godinho. “E o milho se mantém atrativo em regiões onde a segunda safra é viável”.
Em um cenário de boa produtividade, a previsão é de uma colheita de 2,8 milhões de toneladas. O volume não atende à demanda do setor moageiro do Paraná, de cerca de 3,96 milhões de toneladas, segundo a Associação Brasileira das Indústrias de Trigo (Abitrigo).
No Rio Grande do Sul, a área deverá ter uma diminuição de mais de 20%, segundo Hamilton Jardim, diretor da Comissão do Trigo da Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul). Em 2024, o cultivo ocorreu em 1,3 milhão de hectares.
Segundo ele, parte da área de trigo será substituída por canola — a área dessa cultura deve dobrar em relação à do ano passado, com o apoio de empresas cerealistas — e, em menor escala, por cevada. “O resto vai para culturas de cobertura. Não temos opção como o milho safrinha que existe no Paraná”, disse Jardim.
Para ele, o produtor do Rio Grande do Sul está fragilizado financeiramente, enfrentando crédito caro, alta nos custos dos insumos e insegurança quanto à política de renegociação de dívidas.
“Viemos de uma sequência de eventos climáticos, safras frustradas nos últimos cinco anos. A última cultura de inverno que deixou renda foi colhida em 2022. Bilhões de reais deixaram de circular no campo. Por isso, pedimos desesperadamente atenção à repactuação das dívidas”, disse ele.
O presidente do Sindicato das Indústrias de Trigo do Estado de São Paulo (Sinditrigo), Maximiliano Piermartiri, diz esperar “uma safra bastante reduzida”. O Estado deve colher 366 mil toneladas. Em 2024, foram 358 mil. “O milho está com preço agressivo e tem virado algumas lavouras de dupla aptidão”, afirma.
A capacidade de armazenagem em São Paulo também é um gargalo. “É pequena e cara”, explica. Segundo ele, 47% da armazenagem é feita dentro das empresas. “À medida que o próprio produtor consegue ter um domínio maior sobre o momento da venda de seu produto, ele consegue ter um rendimento melhor”, comenta.
Além disso, São Paulo enfrenta desvantagens em relação a Estados do Sul. “O Estado sofre com a competitividade do Paraná e Rio Grande do Sul, que oferecem mais incentivos fiscais. Isso afeta a atração de investimentos para o setor moageiro paulista”, avalia.
Fonte: Globo Rural
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