Superávit bate recorde em julho com tombo das importações

Coronavírus
04/08/2020

O superávit da balança comercial de julho alcançou US$ 8,06 bilhões, com alta de 237% contra igual período de 2019 e recorde da série histórica do governo, considerando todos os meses. Apesar do efeito positivo do resultado nas contas externas, porém, analistas destacam que tanto embarques quanto desembarques caíram. O tombo das importações em julho foi de 35,2% ante igual mês do ano passado.

A queda de importações vem desde abril, mas se acentuou, num reflexo de contração da demanda doméstica, sob os efeitos da pandemia. Em junho o recuo foi de 27%, na mesma comparação, sempre na média por dias úteis. Do lado das exportações a queda foi de 2,9% em julho. Os dados são da Secretaria de Comércio Exterior (Secex) do Ministério da Economia.

A queda das importações em julho foi generalizada, puxada principalmente pelo recuo de 33,6% em bens da indústria de transformação.

José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior (AEB), diz que o superávit de julho, apesar de recorde, é triplamente negativo, pois resultou de quedas de exportações, importações e corrente de comércio. O melhor termômetro, defende, é a corrente de comércio (soma das exportações e importações), que reflete a atividade econômica.

Segundo a Secex, a corrente de comércio caiu de US$ 231,1 bilhões de janeiro a julho de 2019 para US$ 212,2 bilhões em igual período deste ano. No acumulado até julho, as importações ficaram em US$ 90,9 bilhões, queda de 10,5% As exportações somaram US$ 121,286 bilhões, com queda de 6,4%, sempre pela média diária.

Para Rafael Cagnin, economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), mesmo que a intensidade seja amenizada, a queda de importações deve chegar ao fim do ano na casa de dois dígitos. Além do baixo nível de atividade da economia doméstica afetada por medidas de isolamento social na pandemia, Cagnin lembra que o Brasil já tinha uma crise econômica anterior e está em estágio diferente de importantes mercados internacionais em relação à covid-19.

Enquanto alguns países já iniciam a retomada, o Brasil ainda atravessa a pandemia, o que contribui também para que neste momento a pressão sobre as importações seja maior que a sobre as exportações. Por isso, avalia, há em julho uma amenização da queda dos embarques e um aprofundamento na redução de importação.

Cagnin lembra também que há o efeito dos preços das commodities nas importações agravando o impacto da queda de volume. Ele exemplifica com a importação de óleos brutos de petróleo, cujo preço de importação caiu 9,5% em julho em relação a igual mês de 2019 enquanto o volume despencou 54% no mesmo critério. “Há o fator preço ligado à economia global e também o de volume, relacionado à economia doméstica.”

O perfil da reativação da economia brasileira vai influenciar o ritmo de queda das importações nos próximos meses. “Mas há toda a chance de continuar em queda de dois dígitos nos próximos meses.” À medida que caminhamos ao fim do ano, diz ele, programas emergenciais devem ser reduzidos, com endividamento maior no setor público e privado. A esperança, diz ele, é que o consumo reprimido de camadas da população com renda mais preservada que possa dar dinamismo ao consumo. “Mas acho que isso não deve ter força suficiente para colocar a economia para girar em velocidade muito mais alta ainda neste ano.”

O secretário de Comércio Exterior do Ministério da Economia, Lucas Ferraz, reforçou que o mundo passa por uma crise sem precedentes, embora os indicadores demonstrem “que o pior já passou”. Segundo ele, até agora os dados estão em linha com projeção do governo de superávit de US$ 55,4 bilhões em 2020. A combinação da “resiliência” das exportações e da intensificação na trajetória de queda das importações em julho pode levar analistas a revisar as projeções de balança comercial. Silvio Campos Neto, economista da Tendências, diz que a consultoria deve, nos próximos dias, revisar para cima a sua atual estimativa de superávit de US$ 49 bilhões para este ano. Segundo ele, a nova projeção deve ser de superávit entre US$ 55 bilhões e US$ 60 bilhões. Mesmo que as importações devam reduzir o ritmo das perdas nos próximos meses à luz de uma esperada retomada gradual da economia doméstica, diz ele, a balança ainda deverá apresentar “saldos robustos” na sequência do ano.

A queda de 35,2% nas importações de julho, diz Campos Neto, vinha sendo desenhada pelas prévias semanais. “A contração intensa da demanda interna, com destaque para as restrições de deslocamentos, soma-se à consolidação de uma taxa de câmbio bastante depreciada, panorama que mantêm as importações deprimidas.” Na abertura de dados, o economista destaca quedas expressivas em segmentos importantes como óleos combustíveis de petróleo e veículos de passageiros.

Nas exportações, Campos Neto destaca o relativo bom desempenho de commodities. Dados da Secex mostram que, apesar da retração do agregado dos embarques, houve desempenho positivo da agropecuária, com alta de 17,3% em julho contra igual mês de 2019. A recuperação mais rápida da economia da China, aponta o economista, tem sido fundamental para explicar o comportamento, contribuindo com sustentação de preços e de quantidades. Neste segmento, diz, a soja se destaca, com crescimento de receita de 39% em julho na comparação interanual.

Fonte: Valor Econômico

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